terça-feira, fevereiro 13, 2007

Voa


Voa, meu amigo,
voa desse lugar inóspito,
que não és eterno!

Sai daí e descobe a vida!
Apressa-te que é tempo,
que já o amarelecer se denota
nas árvores que, acolá, vislumbro.

Reparo no medo em ti,
e na alegria que aí sentes,
mas enfrenta o que temes,
que o sonho é possível!

Voa, rápido,
que tudo urge.
Deixa essa linha
que o carrasco se aproxima.

Voa, meu amigo,
que te necessitas.
Voa, agora, ser alado,
que te espero voltar a ver.

Voa, felicidade mascarada...

quarta-feira, fevereiro 07, 2007

Abriu, mecanicamente, a porta de casa dos seus pais e entrou sorrateiro, não por mal algum cometido, simplesmente não queria falar com ninguém, e encaminhou-se para o quarto, abençoando o facto de afinal estar sozinho, pelo menos alguma coisa que lhe corra bem hoje. Deitou-se na sua cama - que bem lhe sabia estar assim estendido num colchão que apesar de velho ainda o surpreendia da acalmia que lhe transmitia -, e puxou de um cigarro (é só um), sentindo o leve arranhar característico enquanto o saboreava placidamente. E nesse saborear relaxante deixou-se levar pelos ininterruptos assaltos dos pensamentos, acabando assim por reviver aquilo a que se tinha comprometido esquecer.

Tinha acabado de chegar ao local de encontro, previamente estabelecido, e sabendo-se adiantado sentou-se nuns degraus minimamente resguardados das pessoas que iam passando rua acima e rua abaixo, mas de maneira que não as deixasse ele de as ver, pois esperava o que ainda estaria para vir, e assim sendo exigia-se de parte dele a atenção necessária para tal. Não tendo trazido consigo nada que o entretivesse, nem um simples livro de bolso, decidiu acalmar o vício, pois, de experiências anteriores, sabia-se à espera de algo atrasado, e começou por olhar ao seu redor, memorizar aquele lugar frio e sombrio que o acolhia e protegia da chuva que começara a cair, mas, no entanto, nada havia a reter, eram só uns simples degraus de mármore gélidos, esquecidos pelo sapateado metódico daquelas gentes atarefadas.

Ainda agora, que já apagou o cigarro, não sabe dizer se foi devido a esse martelar ritmado e constante ou se ao som do estilhaçar das bátegas ao cair na calçada, que se deixou, estranhamente adormecer, após horas de infindável tédio de espera. Tem apenas por certo a raiva e tristeza que nem o aconchego do familiar e o cigarro que jaz já ao lado de outro conseguem atenuar.

Fora mais uma vez esquecido e confinado a uma solidão que nem era sua, e que agora prometia não esquecer.